
A mão de obra jovem e qualificada começa a entrar em escassez e a preponderância de profissionais mais velhos cresce, aumentando a idade média das forças de trabalho
O envelhecimento de boa parcela da população está ocorrendo em muitos países e traz desafios aos governos, sociedade e mercado de trabalho. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS, 2015), até o ano de 2050, o número de pessoas acima de 60 anos chegará a 2 bilhões. O Brasil, que hoje detém o 5º lugar nos índices de países com populações mais idosas do mundo, em 2030, terá mais idosos que jovens de zero a 14 anos.
Pesquisadores como Streb, Voelpel e Leibold (2008) e Tonelli (2018) explicam que, com a constante queda dos níveis de fecundidade, inúmeros países atingiram índices abaixo do necessário de reposição da sua população economicamente ativa. Isso gera impacto direto na composição da força de trabalho, tornando-se uma preocupação de governos e empresas no mundo inteiro.
A mão de obra jovem e qualificada começa a entrar em escassez e a preponderância de profissionais mais velhos cresce, aumentando a idade média das forças de trabalho. O impacto desta equação está mudando o conceito de vida e trabalho, tornando cada vez mais recorrentes as discussões relacionadas à capacidade laboral do trabalhador mais velho.
Questões sobre como liderar equipes multigeracionais e até quando esses trabalhadores conseguem manter sua capacidade de aprendizado ou de procurar por novos desafios entraram para a agenda do mercado de trabalho mundial.
Com o aumento da média de idade da força de trabalho, as empresas dependerão cada vez mais dos conhecimentos dos trabalhadores mais velhos em ambientes de crescentes mudanças, adaptações, pressões e demandas por habilidades de alto nível. Esse cenário exige uma estratégia de RH e de Governança para desenvolver ações que vão se transformar em um diferencial competitivo.
Lidar com o etarismo, termo utilizado para caracterizar o preconceito e a discriminação das pessoas, principalmente as mais velhas tem sido uma barreira. O estereótipo está presente nas mentes de vários profissionais e muitos deles ocupam as principais vagas dentro das empresas. Inegável que pessoas com mais idade podem sofrer algumas limitações. Mas, de modo algum isso as classifica como improdutivas.
A questão fica ainda mais complicada quando não conseguimos definir o que seria uma pessoa idosa. A verdade é que os 60 são os novos 30, e precisamos trabalhar para que isso seja uma realidade para as pessoas. Então, a diversidade etária não é apenas mais uma opção interessante para empresas, sociedade e governo. É uma real necessidade e que demanda um pensamento estratégico estruturado de forma a gerar benefícios reais para todos. Hoje, muitos escolhem trabalhar até os 70 ou 80 anos porque gostam e se sentem bem e completamente dispostos.
Do ponto de vista de consumo, segundo o IBGE, o Brasil soma 55 milhões de consumidores acima de 50 anos. Um em cada quatro brasileiros já entrou na maturidade em um mundo cada vez mais digital, ágil e conectado.
Entretanto, quatro em cada dez desses brasileiros reclamam que: “Faltam produtos e serviços que satisfaçam suas demandas”. Reclamam sobre a invisibilidade nas campanhas publicitárias; falta de acessibilidade nos pontos de venda, inclusive digitais; no desenvolvimento de produtos; nas cores e formatos de roupa entre tantos outros exemplos que comprovam o quanto as marcas ainda precisam se preparam para lidar com esse novo desenho de mercado.
De olho nisso, gigantes como Google e Facebook já adotaram Políticas Family Friendly e mercados como de Taiwan, Japão, Alemanha, entre outros, investem em ações voltadas ao público maduro. Entre as medidas mais priorizadas, estão ações de letramento e educação voltadas para necessidade de se quebrar estereótipos e estimular uma boa imagem associada aos mais velhos, entretanto precisamos ir além.
Em artigo publicado por Harvard Business Review, Michael North e Hal Hershfield propuseram quatro maneiras de adaptar a força de trabalho das empresas para estarem preparadas para o envelhecimento da mão de obra.
A primeira proposta dos autores é relacionada à flexibilização, e meia aposentadoria. As empresas não perdem a mão de obra de um colaborador que se encaminha para aposentar, somente reduzem sua jornada de trabalho para metade, por exemplo. Assim ele trabalha ganhando metade de sua aposentadoria e metade de seu salário, sem perder benefícios e a empresa ainda poderá contar com as habilidades daquele colaborador.
A segunda proposta para adaptações seria focar nas habilidades das pessoas mais velhas para fazer contratações. A maioria dos gestores das organizações concorda que colaboradores mais velhos são mais hábeis, mais fiéis com os propósitos da empresa, detêm maiores princípios éticos, pontualidade, equilíbrio emocional e mais experiência. Essa é a segunda ideia: focar nas habilidades e não na idade dos colaboradores. Nos processos seletivos é preciso considerar menos o fator juventude e mais as qualidades e experiências dos candidatos.
O terceiro e quarto pontos são bem interligados, pois dizem respeito a como a empresa pode lidar com seus colaboradores que já estão envelhecendo. O foco seria na adaptação e criação de novas vagas e o quarto ponto seria melhorar a ergonometria no local de trabalho. Com o envelhecimento, as necessidades mudam e adaptações são necessárias.
Em breve, as grandes corporações não poderão mais ignorar os colaboradores mais “velhos” simplesmente pela falta anunciada de candidatos mais novos. Então, é preciso começar a planejar como estabelecer políticas de integração e manutenção de profissionais maduros na empresa e preparar equipes e líderes para essa realidade.
Mesmo que isso esteja se tornando inevitável, as corporações, principalmente no Brasil, ainda resistem à contratação de profissionais seniores. Os motivos dessa resistência têm a ver com o preconceito. Essa é a primeira peça a ser movimentada nesse jogo em que a sorte estará ao lado de quem cultiva e transforma a inclusão em inovação. Essa será a melhor maneira para lidar com o futuro.
Por Juliana Ramalho, CEO da Talento Sênior